sábado, 27 de junho de 2009

Vinicius e sua banheira: juntos até o fim

Por Richard Szames, Gabriela Siciliano Masini e Carlos Vinicius Moura

Foto: Brasil Fashion News

O leitor deve estar se perguntando o motivo que levou o blog em questão a se chamar ‘A banheira do Vinicius’. Pois bem, o post a seguir foi escrito exatamente com o intuito de explicar nos mínimos detalhes essa relação tão forte entre o poetinha, personagem marcante da rica história cultural brasileira, e sua inseparável banheira, localizada em sua casa, no bairro carioca da Gávea.

Vinicius de Moraes tinha como canto principal e mais querido de sua casa a banheira. Isso mesmo. Para o poetinha, não existia algo tão bom quanto o inusitado local para ler, refletir e pinçar as mais diversas inspirações para suas belas e eternas obras. Nela, Vinicius também concedia entrevistas quando se sentia dominado pela preguiça, e assim fazia ao lado do sempre indispensável copo de uísque, o seu melhor amigo, "um cachorro engarrafado" como costumava dizer.

- A banheira era uma verdadeira tara de Vinícius. Por várias vezes cheguei em sua casa e ele estava tomando alguma bebida ou lendo deitado naquela banheira – nos conta João Anibal Pinto Santana, de 88 anos, que após conhecer Vinícius de Moraes em Botafogo, bairro da zona sul carioca, estreitou forte amizade e, ao lado do poeta, vivenciou momentos inesquecíveis.

Entretanto, a tão esperada inspiração para os poemas e composições musicais jamais seria obtida caso algumas ‘medidas de segurança’, termo mais apropriado, não fossem tomadas. Para Vinicius, não se tratava de uma banheira qualquer, daquelas que vivem tão somente cheias d’água, mas um ambiente para o exercício pleno do intelecto, um refúgio, ou melhor, o seu verdadeiro local de trabalho.

As manias, ou talvez meras necessidades do poeta, começavam pelas torneiras. Vinicius não se sentia a vontade sem que estivessem inclinadas sempre na mesma direção, para que o singelo fio de água quente o acalmasse e o de água fria o mantivesse aceso. Evidentemente, não era isso que o faria produzir obras para a história, que marcariam época na cultura nacional, e sim a sua genialidade, que falava mais alto, refletida na voz clara e inteligente de suas obras imortais.

Genialidade esta sintetizada nas palavras de João Aníbal, nosso entrevistado:
- Vinícius era genial. Certa vez estávamos andando pela Rua São Clemente, em Botafogo, por volta das 20 horas e inventamos de tocar violão na calçada. Pois bem, quando nos deparamos, havia mais de 20 pessoas cantando conosco. Foi sensacional. As regalias do poetinha não terminavam por aí. Ora, se dali saíam versos tão complexos e criativos, quem ousaria criticá-lo? A tampa do ralo deveria, obrigatoriamente, ficar um pouco aberta para permitir a renovação da água, como um pensamento, ou melhor, como os próprios caminhos da vida.

Deve-se atentar para a complexidade dos elementos da banheira de Vinicius. Significavam não apenas manias de um poeta, mas sim a abertura de seus horizontes, para um mundo essencialmente abstrato e ao mesmo tempo tão real.

O ‘escritório alternativo’ de Vinicius se tornava completo com a mesa improvisada, que não passava de uma simples tábua apoiada nas bordas da banheira, onde ele punha os livros e todo o material utilizado.
Em contrapartida, a bela história da banheira, que tantos frutos rendeu, termina com um trágico final.

O mesmo palco das grandes inspirações ou simplesmente das refeições diárias que davam força para o poetinha seguir além, serviria para pôr um ponto final ou uma vírgula em sua vida, que segue até hoje não só materializada em suas obras, como também no imaginário popular. O dia nove de julho de 1980 marcaria a morte de Vinicius e o derradeiro suspiro do poeta ocorreria justamente em sua tão querida banheira. Quisera o destino que esta imortal figura brasileira, marcada por um inigualável amor à vida, a deixasse no berço de suas magnifícas composições.


Durante a madrugada, Vinicius de Moraes veio a falecer após sentir-se mal. O poeta compunha a trilha do programa infantil Arca de Noé, da Rede Globo, e após alegar cansaço, dirigiu-se ao seu canto predileto para tomar um banho. Para a tristeza de seus familiares, fãs e admiradores, lá não resistiu, sendo vencido pela dificuldade em respirar, causada por um edema pulmonar agudo. Seu parceiro e amigo pessoal Toquinho, com quem planejava os últimos detalhes do álbum, juntamente a sua última esposa, Gilda Mattoso, tentou socorrê-lo, mas não houve tempo.

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